(Parte II - Ou: A Suruba Que Se Fez Eterna)
(continuação)
Jorge de Piatã (*)
Pelo visto, a recepção ao senador Reinan (Rei-nan) nas profundas é história para trezentos capítulos. Mas vamos ao segundo que, espero, seja o último desta saga.
Assim, continuando, segundo consta do noticiário profano a partir de fontes infernais devidamente credenciadas, o primeiro capítulo desta narrativa teria causado muita insatisfação – e até protestos indignados – em razão da imperdoável omissão de registro, na narrativa da magnífica e nefanda recepção, de algumas presenças ilustres, tanto de companheiros aliados quanto de expoentes tucanos e eminências bolivarianas.
Em sendo assim, em breve flashback, é preciso fazer as devidas inclusões no noticiário já a partir do que se viu nas beiradas do pórtico de entrada do condomínio umbralino no dia daquela diabólica recepção. Registre-se, então, que logo à direita do poste presidencial notava-se mais um poste triste, silencioso e sem luz com a inscrição em sua base: Senador J. Durval e, à sua esquerda, um outro, de aparência simpática e filosofal e do qual emanavam uma luz festiva e uma voz cantando desafinado uma canção da MPB. Na base deste, a identificação: Senador Suplicy.
Em seguida, já no átrio e em pleno evento, marcavam presença, também, como integrantes do comitê de recepção ao senador Reinan na ala dos mais notáveis, os excelentíssimos senadores Serra e Aécio na representação tucana, e as não menos excelentíssimas senadoras Vanessa Grasna-zziotin e Gleisi Narizinho Hoffmann na representação bolivariana. Correção e justiça reclamadas, correção e justiça agora prontamente feitas!
Prosseguindo nos reparos gerais e ainda em flashback, é por demais necessário fazer o registro geral da presença do segundo escalão de convidados, que por constituir uma multidão têm que ser relacionados de forma genérica com indicação apenas de sua profissão ou categoria.
Assim é que despontando mais na retaguarda, marcavam presença: seletos grupos de grandes empreiteiros e de supremos ministros partidários, de marqueteiros e de estelionatários políticos, de felicíssimos banqueiros, de não menos felicíssimos usuários de contas alheias em paraísos fiscais, de socialites que nunca quiseram saber de onde vinham as fortunas de seus respectivos, etc. Todos pisando um tapetão feito com cabeças de deputados, prefeitos, vereadores, industriais, comerciantes, médicos, advogados e jornalistas gananciosos, de sonegadores e agiotas, de servidores públicos, juízes, promotores e policiais venais e/ou preguiçosos, de líderes populistas e sindicalistas safados, de pastores e sacerdotes hipócritas, de militantes políticos e religiosos fanáticos e até de políticos que embora considerados éticos passaram o resto de suas vidas praticando o pecado original de permanecerem obedientes e fiéis a companheiros e a partidos notoriamente corruptos ...
Feitos os justiçamentos e os reparos gerais, passemos à narrativa do que se seguiu:
Logo após o encerramento da tétrica solenidade, aproveitando-se do natural clima de conspiração então reinante, o impávido senador Jucá chamou para uma conversa “reservosa” o senador Reinan e os seus demais pares que estavam mais distantes do senador Lúcifer, conclamando-os:
– Companheiros, preciso do apoio de todos para implantar também aqui no inferno o meu projeto vitorioso da Suruba Privilegiada que, como é sabido, privilegia de forma privilegiada com o foro privilegiado todos os companheiros privilegiados. Infelizmente, o companheiro Lúcifer, por natural inveja, está boicotando sua aprovação... Ôps!
Neste momento, com o estrondo de um raio, aparece diante de todos, fumegante, o senador Lúcifer que, com sua voz cavernosa, exclama:
Ahá..., conspirando, não é Jucazinho? Não seja por isso, não precisa de golpe. Aqui vossa excelência tem todos os méritos e privilégios! E por isso, bato o martelo. Seu privilegioso projeto está, aqui e agora, também aprovado por infernal unanimidade! E, como sempre “tamo juntos”, vamos logo comemorar! Aproximem-se “todos e todas” de costas e, vocês, Jucazinho e Reinanzinho, se acheguem de mim, juntinhos e também de costas!
Dito isso, por efeito da irresistível força demoníaca, as roupas dos convivas foram subitamente arrancadas e, ficando todos pelados, as luzes se apagaram.
E o que se seguiu foram gritos horrendos. De todos os golpistas e conspiradores privilegiados. Mas, o que mais ecoava no breu do inferno eram os gritos do Reinanzinho implorando um pouquinho de vaselina e os berros do Jucazinho que clamava:
– Socorro, gente, vaselina e gelo por favor! Por favor! Respeitem meus privilégios, porra! Você me paga, Boechat!