Opinião – 25.02.2019

R$21 milhões pelo lixo

 

Lucas Spínola (*)

 

Os recentes discursos do vereador Josemar Miranda, questionando a qualidade do serviço prestado pela Lig Lixo, e a matéria publicada pelo jornalista Raimundo Marinho, do Mandacaru da Serra, informando sobre a condição de contratação da referida empresa, reascendem o debate quanto à terceirização do serviço de limpeza urbana no município [Livramento de Nossa Senhora, Bahia]. 

A L&M Serviços de Limpeza Ltda., cujo nome fantasia é Lig Lixo, já recebeu, ao longo destes pouco mais de 6 anos de prestação de serviço, pelo menos R$21 milhões dos cofres públicos. O vínculo se iniciou antes mesmo da realização formal da posse de Paulo Azevedo [prefeito: 2013-2016], ou seja, sem qualquer amparo legal, e vem sendo renovado, ano após ano, assumindo uma falsa condição de vantajosidade para o poder público, tendo havido apenas dois processos licitatórios neste período, o segundo deles aconteceu na gestão atual.

Como se pode ver, a limpeza urbana em Livramento tornou-se um negócio multimilionário. Quem conhece ou pelo menos acreditava conhecer o atual prefeito Ricardo Ribeiro [José Ricardo Assunção Ribeiro] sabe que o mesmo criticava o valor pago à empresa e a terceirização do serviço, mas, ainda assim, manteve os laços com a Lig Lixo, sem nunca ter esclarecido os milhões de motivos que pode tê-lo convencido se tratar de uma boa ideia. 

Fato é que o escopo do contrato celebrado na gestão anterior, entre outros [itens], abrange a varrição de 2.770 quilômetros. O número é no mínimo curioso, pois, conforme indica o Google Maps, do Ginásio de Esportes [no bairro Taquari] até a estrada que liga [Livramento] ao município de Rio de Contas, trecho que contempla as principais avenidas da cidade, há apenas 3,4 quilômetros e o montante total indicado em contrato seria suficiente para que a mesma fosse limpa 815 vezes, em um único mês. 

Outras referências que servem para nortear o quão representativo é este número para a cidade, a Rua Gonçalo Pereira e Silva, principal rua do bairro Estocada, possui cerca de 900 metros; toda extensão pavimentada da Avenida Dr. Nelson Leal possui aproximadamente 2,3 quilômetros; e a Rua José Maria Tanajura, no Bairro Polivalente, tem aproximadamente 500 metros.

Como é sabido, nem todas as áreas da cidade tem serviço diário de varrição, porém seriam necessários que fossem varridos 110 quilômetros ao longo de 25 dias por mês, de modo a justificar o valor contratado. As ruas indicadas neste texto são trechos bastante significativos para a cidade e representam apenas 7,1 quilômetros deste montante, menos de 10% do total contratado por dia.

Na segunda licitação, o critério foi alterado e foi indicado como unidade do serviço a qualificação hora/homem. No edital, está contemplado a contratação de 19.850 hora/homem, o que equivale a dizer que a empresa tem por obrigação manter um total de 100 homens atuando na varrição, coleta de lixo, capinagem, poda e pintura de meio-fio, durante 8 horas, ao longo de 25 dias por mês. Ressalta-se que neste quantitativo não são contemplados funcionários administrativos ou de fiscalização do serviço. 

Para se julgar a qualidade do serviço, é mais do que necessário conhecer aquilo pelo qual estamos pagando, já que não se tem conhecimento de como é realizada, nem quem é o responsável pela fiscalização dos serviços. Se você ainda não tinha conhecimento, trouxe aqui alguns dados que podem lhe auxiliar neste julgamento. Ficam as perguntas: a Lig Lixo oferece o serviço que pagamos? O serviço vale os cerca de R$11 mil por dia trabalhado? Agora, cabe a cada um o julgamento, sem antes não esquecer que já se foram mais de R$21 milhões pelo lixo.

(*) Roberto Lucas Spínola, natural de Livramento, é economista e professor da Universidade Salvador–Unifacs.