Foto-Livro – 21.09.2024
Por Fabrício Medeiros (*)
O Projeto Trabalha(dor) propõe a publicação de um fotolivro físico, tendo como temática o trabalho e as memórias dos trabalhadores rurais da comunidade de Pedrinhas, localizada a cerca de 50 km da sede do município de Livramento de Nossa Senhora (BA). O livro imita o formato e aparência da carteira de trabalho, reunindo depoimentos dos trabalhadores rurais e fotografias reveladas em cianotipia, feitas pelo proponente durante a pandemia da Covid 19. O projeto busca promover reflexões sobre as relações de trabalho, dificuldades, dores e desgastes relativos ao trabalho rural, dando visibilidade às memórias e histórias destes trabalhadores anônimos.
Nasci e cresci no município de Livramento de Nossa Senhora, tendo a maior parte de meus familiares maternos residindo em Pedrinhas. Uma comunidade composta por cerca de 20 famílias, que vivem do cultivo da terra e de pequenos rebanhos. Em 2020, ano ainda assolado pela pandemia, fui lá visitar meus parentes. Vasculhando um antigo baú, encontro diversos pertences de meu avô, já falecido. Entre os objetos, estava sua antiga carteira de trabalho. Ao analisar seu interior, percebo poucos contratos de trabalho, o que demonstra, para mim, a
dificuldade em se trabalhar e viver como lavrador.
Após essa experiência, comecei a fotografar os trabalhadores rurais da comunidade, no seu dia-a-dia de trabalho, além de conversar e gravar depoimentos deles sobre suas memórias, histórias e vida, naquele local. Posteriormente, revelei as fotos de forma artesanal, por meio da técnica de
Cianotipia, que é um processo de impressão fotográfica em tons azuis, descoberto em 1842, pela botânica e fotógrafa inglesa Anna Atkins e pelo cientista e astrônomo inglês Sir John Herschel.
A impressão da cianotipia acontece por contato. Primeiramente, sensibiliza-se um
papel com a emulsão da cianotipia. Após a secagem, coloca-se um negativo, produzido com auxílio do Photoshop e impresso em folha de acetato. Em seguida, com o negativo e o papel, no mesmo tamanho, realiza-se a exposição do mesmo à luz solar. Depois, faz-se a lavagem e a finalização do processo. Ironicamente, o mesmo sol do sertão que traz a seca e desgasta estes trabalhadores, é o mesmo que ajuda a revelar, de forma artesanal, as fotos.
Dessa forma, busca-se promover reflexões sobre as relações de trabalho, dificuldades, dores e desgastes relativos ao trabalho rural anônimo, dando visibilidade às suas histórias e memórias. No total, foram produzidas 25 fotos e colhidos 10 depoimentos, selecionados para compor o fotolivro, como disse, no formato e aparência de uma carteira de trabalho (A6–14,8cm x 10,5cm), tendo de 40-50 páginas, com tiragem inicial de 200 exemplares.
(transcrição adaptada)
Pedrinhas não é só o diminutivo da palavra pedra, mas também é nome de uma pequena comunidade sertaneja de trabalhadores rurais, composta por pouco mais de 20 famílias, que vivem do cultivo da terra e manejo de pequenos rebanhos, no interior do município de Livramento de Nossa Senhora (BA).
Em uma de minhas inúmeras visitas à comunidade, ao vasculhar um antigo baú, encontro diversos pertences de meu avô, já falecido. Entre os objetos, estava sua antiga carteira de trabalho e recibos de contribuição previdenciária, a maioria com as páginas em branco, fato que me provocou uma série de questionamentos.
Converso com os moradores que contam histórias que são como “pedrinhas preciosas”. A cada foto, um registro, uma memória, um desgaste, uma dor. Que encontra na técnica de cianotipia uma forma de materialização destas imagens e experiências.
Trabalho, palavra derivada do latim tripalium ou tripalus, que é o nome de uma ferramenta utilizada na imobilização de animais para a ferragem, mesmo nome do objeto de tortura formado por três estacas de madeira utilizado contra pessoas escravizadas. A análise etimológica da palavra permite tecer reflexões sobre nossas relações de trabalho e da sociedade que buscamos construir.
Este livro é uma forma de dar visibilidade e levantar questões, mas também é de homenagem aos trabalhadores e trabalhadoras que vieram antes de nós e aos que ainda (re)existem ao “agro pop”, latifundiários inescrupulosos e capitalismo selvagem. A luta é todo dia! E se faz necessário semear novos caminhos para se colher um futuro melhor.