BRUTUS
Depois dos meus, daqueles a quem devo Desde o ser ao que sou, ora te digo, O Brutus foi o meu melhor enlevo E o meu maior amigo
Ao mundo veio quando a Humanidade Se estercia na crise que lavrava Com um incêndio enorme, apocalipse, Devorando nações e dinastias. - Ao mundo veio quando a terra toda Era presa das chamas em que ardiam Deus nos altares, no homem – o caráter: Quando tudo mudava e quando, ao certo, Amizade e traição se confundiam, Da honra a noção nos homens se apagara Do justo se apagara o são princípio. - Ao mundo veio assim como um exemplo E um castigo de Deus na sua inerrancia Na onisciência perfeita em que se plasma.
Seis lustros percorri, marcha batida, De vitória em vitória, na existência, Sempre na torre do comando, sempre Nas serranias que o Poder levanta. Até que um dia me exalcei ao cume Do mais alto poder que a pátria ostenta E encontrei-me entre Reis, entre Monarcas, Chefes Civis e Príncipes de Igreja... Todos cujo o poder do mundo inteiro Encerram em suas mãos... E os meus amigos, Exército incontável, fauna imensa, Em progressão geométrica crescendo... Neste ponto interrompo a narrativa... A mim também chegou-me o mal do mundo, Desci das posições que conquistara As planícies da Vida. E vim sozinho. - Onde os meus amigos que me acompanhavam? Onde o valor dos chefes militares? Cuja é a promessa dos vasalos? Onde? Onde os chefes civis que me seguiam? E o poder dos Monarcas, e as alianças De outras nações? Onde o poder do Ouro De banqueiros que chegam a ignorar-me?
Tudo, tudo falhou, que tudo falha Quando na vida um passo em falso damos. Mas, se tudo falhou, nesse momento Não me falhou o cão cujo caráter Pôs Deus acima do Poder humano Para vergonha e exemplo desses homens Que estão abaixo de seus pés... O Brutus Como que tudo compreendendo, como Com a alma divina penetrando Meus próprios pensamentos, acudia Ao mais incerto gesto ao mais incerto Manifestar de uma vontade minha: E era como se fosse a minha sombra Mas, não sombra sem vida, sombra inerte (Mancha que a luz projeta e a luza apaga) Sombra viva da dor e da alegria. A sombra da alma é que ele projetava, Qual desvelado e vigilante amigo. Esse, sim não Faltou. O amigo existe. E a palavra amizade que fugira Do coração dos homens, tem seu trono No coração dos cães.
JÚLIO PRESTES |