Todos espaços da câmara ficaram lotados durante a audiência pública
Parceria ficou ainda mais suspeita
A audiência pública da Câmara de Vereadores, dia 10 de abril, deixou ainda mais nebulosas as circunstâncias envolvendo a parceria que a Prefeitura Municipal de Livramento de Nossa Senhora anunciou que firmará com a empresa denominada SINAGER (Sistema Nacional de Apoio e Geração de Emprego e Renda), para gerenciar a área de saúde e transporte escolar no município. Antes, as suspeitas recaiam apenas sobre o fato da empresa ter sido anunciada sem licitação pública ou concurso de propostas, como manda a lei, desencadeando um processo de desconfiança, ante a possibilidade de uso irregular do dinheiro público. Isso levou os vereadores a requerer a realização da sessão pública, para discussão e amplo esclarecimento do assunto.
A população lotou todos os espaços da Casa Legislativa, inclusive o pátio externo. Mas o que deveria ser um encontro de transparência e esclarecimentos aos cidadãos acabou numa grande frustração. Primeiro, porque a SINAGER enviou duas pessoas totalmente desinformadas sobre a realidade de Livramento e até mesmo sobre a finalidade da reunião. Segundo, porque alguns dos políticos que compuseram a mesa de trabalho engalfinharam-se em bate-bocas e transformaram o local em palco de troca de farpas, em total desrespeito às pessoas que foram assistir e participar da sessão pública.
Bizarrices e constrangimentos
Mas ficou a certeza de que tal parceria não vai melhorar os serviços a cuja execução se destina. Pelo contrário, vislumbra-se uma larga avenida para gastos desnecessários e desvio de dinheiro público. Não foram apresentados o projeto nem as bases do contrato em que se assentarão as ações a serem executadas. Houve situações bizarras e patéticas, como o fato dos representantes da empresa falarem mais de duas horas, sem que ninguém soubesse seus nomes e suas funções na empresa. Somente quando lhes foi mostrada a falha (ou intenção) cometida, é que se identificaram, ainda assim de forma desleixada, dizendo que um era Hércules e outro era Endes.
Outro momento constrangedor deu-se quando indagado por um vereador, o consultor respondeu que os donos da SINAGER eram “pessoas normais, como todo mundo”, levando o inquiridor a retrucar que isso era o mínimo que se esperava delas, já que “ETs” e débeis mentais não poderiam ser. Foi necessário então que se insistisse para que o consultor respondesse que havia presidente, diretor e secretário, citando os respectivos nomes, ficando de logo a certeza de que se trata de uma pequena agência ou uma empresa de fundo de quintal, pois estrutura tão simples não é compatível com o trabalho que pretendem realizar, no âmbito da saúde e do transporte escolar do município.
O primeiro representante da SINAGER a falar foi o Sr. Endes, que se mostrou ansioso sempre em frisar que o hospital de Livramento vai muito bem e continuaria como está. Que sua empresa iria atuar somente nas áreas de saúde e educação. Como excluiu o hospital, atualmente muito carente, embora seja a base da saúde na região, sobrou apenas o Programa Saúde na Família, que não é da Prefeitura, mas do governo federal. Para ele, o transporte escolar faz parte da área da educação, mas se engana, é área administrativa.
Livramentense foi subestimado
O segundo palestrante, Sr. Hércules, subestimou a inteligência dos livramentenses, dizendo que sua empresa é do terceiro setor e este é novidade no Brasil. Demonstrou não saber que o terceiro setor, formado por entidades sociais não governamentais, existe no país há mais de 20 anos. Ao invés de falar da sua empresa, a SINAGER, que pretende ser parceira da prefeitura, falou sempre de OSCIP, sigla da expressão “organização da sociedade civil de interesse público”, que é a natureza jurídica das entidades que lei federal considera habilitadas a firmar essas parcerias.
O Sr. Hércules reafirmou que a SINAGER não vai gerir o hospital, apesar de integrar, como elemento principal, a área de saúde do município. Procurou tranqüilizar os servidores do hospital, mas ninguém acreditou nele. Disse genericamente que o governo federal vai ceder tributos para financiar a parceria, mas não explicitou como isso se dará, pois não há previsão legal nesse sentido. Disse que a Prefeitura vai ficar também com a “cota patronal”, mas não soube definir essa tal “cota patronal”. A cota patronal que se conhece é a parte da contribuição social devida ao INSS pelos empregadores, calculada sobre a folha de pagamento e especialmente destinada a financiar a Previdência Social.
Quanto ao imposto de renda que disse a prefeitura vai reter só poderá abranger o que é descontado na fonte de seus próprios servidores, o que não daria para financiar o projeto em questão. Disse também que a SINAGER tem como um dos objetivos principais gerar empregos e que fará isso em Livramento através da capacitação profissional dos desempregados. Outro engano, pois a capacitação de nada valerá se não houver vaga disponível no mercado de trabalho. A abertura dessas vagas só é plausível com investimentos na economia, ou seja, na indústria, no comércio e no setor de prestação de serviços, o que não é o caso da dita empresa.
Perguntas ficam sem respostas
Os dois representantes da SINAGER não responderam ou responderam insatisfatoriamente todas as perguntas feitas pelos vereadores e pessoas da platéia. Algumas das perguntas não respondidas: há quanto tempo eles trabalham para a empresa? Como o governo federal vai ceder tributos para a prefeitura? Como gerar empregos somente capacitando pessoas? Qual o volume de recursos que a SINAGER pretende girar em Livramento? Como uma empresa criada em agosto do ano passado, consegue já atuar em tantas cidades em tão pouco tempo? Qual é o projeto que vocês pretendem desenvolver em Livramento?
Perguntamos a eles qual o volume de recursos previsto nas ações que pretendem desenvolver em Livramento e de onde virão tais recursos. Responderam que virão da Prefeitura, mas não souberam dizer o montante. Essa resposta desmente a resposta anterior de que tributos do governo federal viriam para financiar o projeto. Perguntamos a um deles qual o vínculo do deputado federal Gedel Vieira Lima com a SINAGER, tendo respondido peremptoriamente que “nenhum”, que não conhece o deputado, mas se mostrou visivelmente perturbado e constrangido com a pergunta.
A sessão foi marcada por intensa participação popular. As pessoas não se contiveram nem nos aplausos nem nas vaias e as vaias mais constrangedoras foram dirigidas ao ex-vereador Lafayete Nunes Dourado e ao advogado Lourival Trindade, assessor jurídica da câmara e da prefeitura. Os dois reagiram aos apupos de forma visivelmente descontrolada. Houve bate-boca entre o vereador Ricardo Matias e Lourival Trindade, depois que o vereador acusou o assessor de agir com negligência no acompanhamento das questões jurídicas da Câmara e o causídico atribuiu a acusação a ressentimentos cultivados pelo vereador, que foi catapultado pelo prefeito da “União, Trabalho e Participação”.
Foram momentos lamentáveis, presenciados pelas dezenas de pessoas que foram à Câmara apenas com o intuito de ouvir esclarecimentos sobre o contrato que a prefeitura pretende firmar com uma empresa sobre a qual pesa a suspeição de não ter qualquer preparo para o trabalho que se propõe desenvolver.
Recursos são manipulados
Ficou evidenciado que a parceria anunciada pela Prefeitura de Livramento, a ser firmada com a SINAGER, não tem objetivos claros, pois sequer um projeto foi apresentado. Muito ao contrário, a população presente ao encontro saiu com mais dúvidas ainda e aumentou a suspeita de que pode estar havendo, por traz de tudo, uma manobra que levará mais dinheiro público para o lixo, sem qualquer melhoria dos serviços abrangidos.
A experiência em outros municípios mostra que a quase totalidade de recursos do orçamento das prefeituras são manipulados por essa empresa do setor privado, que diz não ter fins lucrativos, somente para gozar de facilidades para contratar com o poder público. Porém, paralelamente, costumam contratar empresas comerciais comuns, criadas pelos mesmos donos daquelas, através das quais o dinheiro vai para as mãos de particulares, pela prática muitas vezes criminosa de emissão de notas fiscais falsas ou do superfaturamento. Tudo fica aparentemente dentro da lei, mas o dinheiro via de regra é desviado e roubado.
Restou a certeza de que isso pode acontecer também em Livramento, daí as reações indignadas no recinto da Câmara e o bate-boca entre os políticos. Foi uma espécie de clamor dos que temem ser prejudicados – o povo; o ataque dos que não poderão ou não querem ser beneficiados – os oposionistas; e a réplica dos que estão prestes a ingressar na roda da fortuna. Comenta-se que tudo começou depois que o prefeito Carlão se uniu ao deputado federal Gedel Vieira Lima. Na mesma ocasião, Carlos Roberto Souto Batista, expulsou o PC do B e PT da coligação “União, Trabalho e Participação”, partidos que ainda têm militantes que ficam corados, felizmente, diante da desfaçatez e da malversação do dinheiro público.
Baixaria na frente do povo
O poder político de Livramento demonstrou, naquela audiência, o desprezo que nutre pela comunidade, transformando o ato numa espécie de lavagem de roupa suja em público. Dois incidentes colocaram a nu essa realidade. O vice-prefeito João Cambuí, constitucionalmente o substituto legal e natural do prefeito, foi tratado com deselegância pela mesa e pelos palestrantes. Pela mesa, porque anunciou como representante do prefeito o Sr. Lafayete Nunes Dourado, funcionário de provimento temporário do gabinete do prefeito. Pelos palestrantes, por ignorarem solenemente a presença do vice, ao se dirigir às autoridades presentes, quando ele era, no momento, a maior autoridade, posto que estava na condição de prefeito municipal, não de mero representante.
O incidente mais patético e lamentável deu-se quando o assessor jurídico da câmara, advogado Lourival Trindade, quebrando a hierarquia, pois é funcionário da casa, e transgredindo o regimento, arrebatou o microfone e discursou longamente, à revelia do presidente Marilho Matias, que já tinha encerrado a sessão. Estranhamente, o advogado chegou a se dirigir ao presidente, como se o ato não houvesse sido encerrado, inclusive o presidente já havia deixado a mesa. O veterano advogado e político ficou indignado com as referências que lhe foram feitas pelo vereador Ricardo Matias, que o acusou de negligência para com questões jurídicas da casa, frisando que ele era ao mesmo tempo assessor da câmara e da prefeitura, podendo ocorrer a incômoda situação ter de dar parecer, numa instituição, sobre projeto por ele elaborado, na outra.
O presidente Marilho Matias, que não fez valer o seu “está encerrada a sessão”, permitindo que um auxiliar continuasse falando, minutos antes pedira deculpas pelo desvirtuamento do tema da sessão pública, que descambou para picuinhas políticas, garantindo que nunca mais isso se repetirá. Por fim, a platéia, numericamente inédita na história da câmara, saiu frustrada pelo que queria ouvir e não ouviu e envergonhada pelo que não queria ver ou ouvir, mas viu e ouviu. (Leia mais notícias, amanhã).
A mesa diretora da Câmara não manteve controle dos trabalhos
A parceria anunciada pela prefeitura despertou muito interesse
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